“Todo esse terremoto nos deixou mancos, incompletos,
parcialmente vazios, insones. Nunca mais seremos o que éramos antes. Melhores
ou piores, cada um saberá. Por dentro, e às vezes por fora, uma tormenta passou
sobre nós, um vendaval, e essa calma de agora tem árvores caídas, telhados
desmoronados, terraços sem antenas, escombros, muitos escombros. Temos que nos
reconstruir, é claro: plantar novas árvores, mas talvez não haja nos hortos as
mesmas mudas, as mesmas sementes. Erguer novas casas, fantástico, mas será
melhor que o arquiteto se limite a reproduzir fielmente o projeto anterior ou
será infinitamente melhor que repense o problema e desenhe um novo projeto, que
contemple as nossas necessidades atuais? Remover os escombros, dentro do
possível, pois também haverá escombros que ninguém poderá remover do coração e
da memória.”
Mario Benedetti, em Primavera num Espelho Partido.