Leio
sobre a teoria do multiverso na coluna do físico e astrônomo Marcelo Gleiser na
Folha de S.Paulo. Segundo ela, o universo que nós (mal) conhecemos seria apenas
“um entre uma multidão de outros universos, todos
parte de um multiverso que pode ter existido por toda a eternidade”. Gosto
dos textos de Gleiser porque ele explica com clareza o que está à beira da
nossa incompreensão. Como imaginar algo ainda maior e mais intangível do que o
nosso universo? Como pensar em bolhas gigantescas convivendo em espaços-tempos diferentes
e estanques desde sempre, sem começo, meio ou fim? Que seres existiriam nesses
outros universos? Como eles seriam? Haveria algum tipo de inteligência
superior? Ou apenas microrganismos unicelulares, como fomos um dia?
Enfim, nossa incompreensão é avassaladora. Uma
avalanche de questionamentos nos leva à mais completa ignorância do que somos
feitos, de onde viemos, para onde vamos e por que afinal estamos aqui. Em A
Árvore da Vida,Terrence Malick trata dessa incompreensão absoluta diante da imensidão
em que estamos imersos. Como encontrar respostas para a perda de quem amamos,
se essa perda é só um farelo no curso da existência do universo? Se o próprio
curso do planeta Terra é, também ele, só um farelo, uma centelha quase
invisível? Nossa insignificância é assombrosa. Lançamos nossas preces ao céu em
busca de um sinal, uma lógica, algo em que possamos nos agarrar antes de
naufragar de vez na inconsciência.
Por outro lado, o quase nada que temos é crucial
para que continuemos vivos. Enquanto o universo segue indiferente o seu
caminho, tendo ou não a companhia de universos paralelos, nós prosseguimos como
nômades por um cotidiano de perdas, frustrações, tédio, medo, cansaço e
sofrimento, mas também de carinho, compaixão, amor, alguma esperança e momentos
fugazes de alegria genuína. Como escreveu Christopher Hitchens em seu último
livro, “Eu não tenho um
corpo, eu sou um
corpo”. Enfim, um mistério ainda maior e mais angustiante que o do
multiverso. A carapaça que nos abriga é também tudo o que somos, em toda a
nossa incompletude e finitude.
A vida é o que nos resta, portanto, já que a
alternativa a ela não é nem um pouco atraente. Viver é bom, vale a pena, embora
por vezes nos desencantemos com uma realidade tão brutal. Enquanto me deixo
fascinar pela possibilidade do multiverso, o mundo banal e irrelevante que
habito se projeta sobre mim com todo o seu tenebroso esplendor. Um mundo feito
de atentados a bomba motivados por pretextos fúteis, execuções gratuitas de
adolescentes pobres, corrupção desenfreada e índices alarmantes da mais pura miséria
humana. E o que é pior: tudo isso é apenas farelo. Apenas uma cócega ligeira na
sola do pé do infinito.
2 comentários:
Gleiser é um bom divulgador de ciência. Certamente, como todos nós, imagino, tem em Carl Sagan o seu ídolo. Os dois têm o talento de esclarecer, despertar interesse por coisas da ciência ou de nos fazer ser tocado pelo fascínio do incompreensível.
O multiverso, os universos paralelos, entre tantos mistérios da ciência, fazem-nos rever a frase de Ruy Barbosa: "se eu soubesse a metade do que eu não sei, eu seria um sábio". Se nós soubéssemos um décimo (milésimo?) do que não sabemos ...
Oi, Armundo
Também gostava muito de Carl Sagan, das colunas que escrevia e que eram publicadas no Estadáo.
A ciência me fascina desde criança, essa busca pelo que não sabemos e pelo que a nossa geração nunca vai conhecer.
Um abraço.
Postar um comentário