A insônia é território da angústia. Um território
opaco e espesso, onde vigília e inconsciência se irmanam e se desconectam,
formando um todo aterrador. Um estado de espírito alterado, como se constituído
de vontade própria, que vara a madrugada lançando centelhas no sono por vir.
Uma neblina sem ternura ou aconchego, que avança na cinza das horas. No quarto
quente, com o ar-condicionado quebrado, a temperatura do corpo é glacial perto
da temperatura da mente, uma brasa vigorosa movida a passado.
A insônia desarruma os desvãos da alma. Desaloja
episódios cuidadosamente esquecidos, remexe no arquivo morto de paixões
cremadas e convertidas em cinzas, impressões enevoadas pelo pouco uso, cidades
há muito visitadas e das quais guardamos só rostos e esquinas. Versos lidos há
pouco ou lidos há décadas. Papéis imaginários. Um desassossego me invade e me
impede de ler o livro de Pessoa na mesa de cabeceira, fuçar a vida alheia nas redes
sociais ou rever pela sétima vez a sequência final de um filme qualquer na tevê
a cabo. Um desassossego silencia o meu sono.
Olho para a insônia e ela me olha de volta, desolada,
como se me pedisse desculpas. Deixo a cama e derramo estas palavras sem lucidez
na tela. Olho meus livros, meus discos, meus retratos. Espelham o que sou, ou
imagino ser. Noite que segue. Sinto falta do papel na máquina de escrever,
sinto falta de sonhos. Minha mente anda muito ocupada por lembranças,
atravancada pela persistência da memória.
6 comentários:
Insônia, companheira de guerra. Adorei
Valeu, Serginho. Mas, para mim, a insônia está mais para uma adversária, que me transforma em terra arrasada na manhã seguinte.
Abração.
terra arrasada: exatamente assim
Isso mesmo, Camila. Uma terra arrasada, refratária ao prazer da inconsciência e do descanso.
Putz!
E cá estou!!!
Seja bem-vinda, companheira!
Bjs
Postar um comentário