Numa crônica recente, Luis Fernando Verissimo refletiu sobre o fascínio que o fascismo exerce na juventude dos países do Leste Europeu. E justificou essa tendência com uma tese interessante: como esses países não puderam compartilhar a avassaladora revolução cultural que varreu os países ocidentais nos anos 60, os jovens de lá têm como modelo o anacrônico nacionalismo pré-Segunda Guerra de Hitler e Mussolini, e não a subversão dos costumes promovida pela era hippie. Como se os tanques soviéticos que sufocaram as sublevações ocorridas na Hungria e na Tchecoslováquia tivessem também sufocado a passagem do tempo. Ou seja: como se por trás da antiga Cortina de Ferro as pessoas vivessem ainda no ano de 1933. Uma época propensa à adoração de ditadores inescrupulosos e pregações a favor do extermínio de judeus, ciganos e outras raças historicamente perseguidas.
O grande risco da humanidade é não aprender com os erros do passado, embora talvez seja o caso de pensar que vivemos realmente em diferentes eras, devidamente estanques entre si – impossível, portanto, aprender com os erros do passado, já que ele ainda é futuro em alguns cantos do planeta. É como se a Terra fosse uma gigantesca ilha do seriado Lost (que não assisti, apenas li a respeito), com suas camadas temporais sobrepostas, nas quais passado, presente e futuro convivem em plena desarmonia. Para transitarmos entre o antes, o agora e o depois, não seria necessária uma máquina do tempo como aquela imaginada por H.G. Wells. Bastaria, por exemplo, uma viagem à Suécia ou à Noruega para nos defrontarmos com uma legítima nação de bem-estar social dos anos 1950, os chamados welfare states, com prosperidade infindável e proteção total ao cidadão, através de sólidos investimentos em projetos sociais. Por outro lado, ir ao Sudão ou a Serra Leoa equivaleria a uma longa jornada rumo a um passado muito mais longínquo, quando os impérios colonialistas deflagraram a ruína de qualquer projeto de civilização viável nesses países. Já um passeio ao Irã de Mahmoud Ahmadinejad ou ao Afeganistão dos Talibãs seria quase um safári, sem passagem de volta, pela era medieval.
Com um presente que se assemelha de tal forma ao passado – para o bem e para o mal –, é de se pensar se há mesmo futuro para a civilização humana. Há, obviamente, mas não necessariamente um porvir alvissareiro. Basta, por exemplo, passar um olho no Brasil, onde ontem e amanhã se encontram e se chocam permanentemente. Em Salvador, cidade em que vivo, é possível contemplar o século 21 e o século 19 cindidos por apenas uma avenida: de um lado, edifícios de apartamentos luxuosos, com arquitetura inovadora e carros de última geração nas garagens; do outro, casebres sem reboco, habitados por miseráveis que reencarnam a chaga da escravidão. A Casa Grande e a Senzala. No meio disso tudo estamos nós, passivos e vulneráveis, tentando a todo custo nos desvencilhar de um dos lados e sermos aceitos no outro.
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