segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Uma rajada de balas


Durante muito tempo ouvimos dizer que as cinematografias do Brasil e dos Estados Unidos reproduziam na tela as obsessões de suas respectivas sociedades. Enquanto a América dissecava a violência, nós nos dedicávamos a glorificar a safadeza. Enquanto eles tinham Dirty Harry, Bonnie & Clyde e aqueles impiedosos desejos de matar do Charles Bronson (depois substituído por Sylvester Stallone, Arnold Schwarzenegger e Jean-Claude Van Damme), a gente se deliciava com as estripulias inconseqüentes de Vadinho em Dona Flor e seus Dois Maridos, a ninfomania traumática de Sonia Braga em A Dama do Lotação ou o liberou geral de Rio Babilônia. Um tempo bom, sem dúvida. Mas um tempo que acabou.

Hoje a realidade é outra, e o Brasil que se vê na tela reflete o Brasil que se vê nos jornais e na rua. Cultuamos a violência com um grau de brutalidade que nem o discurso fascista de Tropa de Elite ou a radiografia certeira de Cidade de Deus são capazes de dar conta – e suponho que nem Salve Geral, recém-indicado a uma vaga no Oscar, também seja. Há milhares de Capitães Nascimentos espalhados pelas grandes cidades, mais ou menos corruptos, mais ou menos truculentos. Assim como há milhares de Zé Pequenos promovendo execuções em massa nas favelas, dando forma a um cenário tosco, sem resquícios de um certo romantismo que em outros tempos embalava produções como Pixote ou Lúcio Flávio, o Passageiro da Agonia. Não há mais causas ou conseqüências, apenas o ato em si, abjeto e sem sentido.

Por mais que o cinema brasileiro contemporâneo tente reproduzir a realidade de forma verossímil, falta desvelar o principal – que talvez apenas Sergio Bianchi, em seus delírios niilistas, tenha percebido: o estado de coisas em frangalhos que presenciamos todos os dias é resultado direto das atitudes e posições equivocadas que tomamos ao longo de décadas. Um exemplo prático: tivemos, há cerca de quatro anos, a oportunidade de desarmar a população, mas optamos por manter os cidadãos de bem com armas em casa, no carro e na cintura. O resultado está aí, bem à nossa frente: os tais cidadãos de bem matam por quase nada em discussões de trânsito ou brigas de bar, por não aceitarem fechadas, buzinas ou olhares indiscretos em direção a seus pares. É uma gente estúpida e amoral, que cultua fuzis AR-15 e submetralhadoras Uzi, vibra com os combates do UFC e venera carros tunados. Traficantes e policiais são de certa forma espelhos dessa gente, com suas rajadas de balas que matam mulheres e bebês e transformam o cotidiano de gente comum num filme de terror B, sem final feliz ou morte do vilão.

2 comentários:

Velho Cowboy disse...

Otexto ta otimo, mas essa fotinha de gay roendo a unha ta foda!

Paulo Sales disse...

É o velho e bom Cowboy dando as caras.
Fotinha de gay uma porra, olha o respeito.
Vamos marcar pra tomar uma cervejinha.
abs