segunda-feira, 19 de abril de 2010

Silêncio


Faz mais de uma semana que não escrevo no blog, e o mês de abril tem sido escasso em postagens. Talvez esteja padecendo do Mal de Montano, espécie de bloqueio criativo que acomete um jovem escritor no romance de Enrique Vila-Matas, que estou começando a ler. Mas é mais provável que esteja cansado de levantar muros de indignação com minhas palavras. A brutalidade do real me exaure, notícias me apunhalam a cada início de manhã e me sinto cada vez mais entorpecido, incapaz de reagir e vociferar contra escândalos acachapantes ou assassinatos sem sentido. Melhor assim. Nunca fui muito bom em escrever movido pela cólera, a saliva escorrendo pelos cantos da boca, as frases se atropelando como numa avalanche. Gosto de mastigar lentamente cada palavra, sentir a sua textura, o seu poder de sedução, a sua capacidade de se harmonizar sem farpas com os outros ingredientes de um texto. E, obviamente, não pretendo fazer deste espaço um desfile de lamúrias.

O fato é que é quase impossível reprimir um certo enfado diante de acontecimentos dignos de asco, como o escândalo dos padres pedófilos, devidamente acomodados dentro da batina do Papa, ou do pai que joga as filhas da ponte. Depois de tantos “por quês” repetidos à exaustão silenciosamente, acabo me dando conta de que meus comentários sobre esses assuntos não vão oferecer nada de novo a ninguém, nem irão contribuir para que eu mesmo compreenda como essas engrenagens encharcadas de estupidez nos impelem incessantemente para o futuro. Prefiro o silêncio, agora interrompido com estas frases soltas neste início de madrugada de uma segunda-feira. Um silêncio que me faz lembrar as imagens daquele vulcão expelindo lava do centro da Terra para cobrir quilômetros de céu na Islândia. É possível encontrar resquícios de beleza e inocência nessa manifestação aterradora da natureza. Afinal, não há ali qualquer vestígio de bem ou de mal. É apenas magma, fogo e fumaça, como no início do mundo. E, provavelmente, como no seu fim.

2 comentários:

Christiana Fausto disse...

paulo,

cheguei aqui via socorro araújo e me encantei com os seus textos. Estou me encantando, porque tenho lido homeopaticamente. Sinto que suas preocupações são muito parecidas com a minha. Se esganiçar, pregar no desertor. Mas vc não está só. Eu, minimamente, coloco-me ao seu lado, nem na frente, nem atrás, ao lado seu (como diria Chico).

Paulo Sales disse...

Obrigado pelas palavras e pela visita, Christiana.
Acho que a inquietação e a angústia são atributos do tempo em que vivemos. Então é quase impossível ficar calado, é preciso expressar de alguma forma o que sentimos.
Um abraço. Seja bem-vinda ao blog.