sexta-feira, 31 de julho de 2009

Talentos invisíveis


Vim para o trabalho ouvindo um disco que adoro: Thelonious Monk at the Blackhawk. Gravação ao vivo, cheia de ruídos de gente conversando, mas que é, junto com Straight no chaser, o meu álbum preferido de Monk. Fiquei prestando atenção nos solos ferinos e metálicos de Charlie Rouse. Solos precisos, vívidos, sem arestas. Principal parceiro de Monk, o saxofonista é um desses casos muito comuns no jazz de artistas talentosíssimos que não alcançam a notoriedade merecida. Rouse lançou discos excepcionais em carreira solo, como Unsung Hero e Takin’ Care of Business, mas nunca figura nessas listas de grandes gênios do gênero. De todos os saxofonistas que trabalharam com Thelonious – Coltrane e Sonny Rollins incluídos –, ele foi o que melhor entendeu as intrincadas estruturas harmônicas do mestre do piano percussivo. Seu solo em Round Midnight, que acabei de ouvir em meio a um congestionamento, me comove profundamente. Como me comovem suas intervenções em Japanese Folk Song e Locomotive, ambas do Straight no Chaser. Mas quase ninguém, fora do restrito círculo de iniciados em jazz, conhece Charlie Rouse, ou apenas se referem a ele como “o sujeito que tocava com Monk”. É o mesmo caso de outros caras maravilhosos mas invisíveis, como Louis Smith (trompetista virtuoso, da escola de Clifford Brown, que tocou com Horace Silver) ou Zoot Sims (um dos ídolos de Luis Fernando Verissimo e criador de ao menos dois discos essenciais: Suddenly it’s Spring e Zoot Sims and The Gershwin Brothers). Mesmo Paul Desmond, o genial sax alto do grupo de Dave Brubeck, não alcançou o prestígio que seu talento exigia. Desmond dizia que gostaria de soar como um dry martini. Ou seja: algo capaz de mesclar contemplação com amargura (se é que essa minha definição de um dry martini pode ser levada a sério). Basta ouvirmos Take Five ou Samba Cantina para constatar que ele conseguiu.

Nenhum comentário: