segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Fundamentalismo à brasileira


Pouco me importa essa briga de pitbulls eletrônicos envolvendo a Rede Globo e a Record de Edir Macedo. Mas é inegável que ela levanta uma questão crucial à nossa sociedade, jogando luz novamente às atividades do auto-intitulado bispo, dono da Igreja Universal do Reino de Deus, mais uma vez envolvido em acusações de enriquecimento ilícito. Enriquecimento óbvio, diga-se, que maltrata nossa inteligência e mina os bolsos raquíticos dos que pagam dízimo. O que incomoda nessa história toda é que, mesmo depois de tudo que já foi dito e visto, ainda existam pessoas capazes de entregar dinheiro de mão beijada a esses ícones neo-pentecostais de paletós cafonas e propensão para o histrionismo. Há mais ou menos uns 10 anos, se não me engano, a própria Globo – que não é nenhuma vestal nessa história – já havia divulgado imagens de Macedo e seu grupo comemorando uma polpuda arrecadação dominical com sorrisos safados e trenzinhos esdrúxulos. Estava lá, para todos verem. Sem montagem ou distorção de contexto. Todos assistiram àquela involuntária confissão de culpa em horário nobre, assim como viram a bispa Sonia e o seu marido, da Renascer em Cristo, serem presos com uma fortuna em dinheiro vivo não declarada ao chegarem aos Estados Unidos. Todos, incluídos aí os adeptos dessas seitas, que viram muito bem para quem dão seu dinheiro, um dinheiro suado, amarfanhado, que faz uma falta danada na hora de pagar a luz, o gás ou o mercadinho fiado. Se optam por acreditar nos argumentos estapafúrdios dos seus líderes espirituais e continuam levantando as mãozinhas para o céu é outra história.

Mas não dá para aceitar passivamente essa extorsão consentida que dezenas de religiões praticam abertamente no país, estendendo seus tentáculos até o Congresso e praticando uma caça às bruxas contra os cultos de origem africana. Não dá para aceitar passivamente que tenhamos no Brasil, em plena aurora do século 21, seres humanos quase tão aprisionados ao fanatismo quanto a massa islâmica que aceita e alimenta o fundamentalismo no Oriente Médio. Obscurantismo ainda é moeda forte, seja lá ou aqui, ou não seria possível construir um império como a Record ou escandalosos templos kitsch de louvor à vulgaridade como os que vemos em todas as grandes cidades do país. Nossa vantagem em relação a eles é que aqui o rebanho serve apenas para ser achacado, em vez de ser recrutado para missões suicidas. Ao menos por enquanto, eu espero.

6 comentários:

Marcos disse...

Os caras criam igrejas com o objectivo de nao pagar nenhum imposto, depois desviam o dinheiro arrecadado em beneficio proprio. Isso é um crime da porra contra os cofres publicos e os pobres q caem nessa armadilha (tem os ricos q caem tb, tipo o imbecil do Kaká). Roubam todos nós no final, depois compram politicos (algo normal) e acabam provocando perdas piores q os radicais islamicos.

Engraçado vc citar as religioes de origem africana, mas o candomble, pra ficar num exemplo, é mal visto aqui. É mais natural na Bahia q em AO...

Paulo Sales disse...

É, e isso na nossa cara, abertamente, com conivência política e tudo. Só discordo de uma coisa: as perdas estão longe de ser semelhantes às que vemos no mundo islâmico radical.
As religiões africanas parecem ter essa sina de perseguição mesmo. Inclusive aqui, onde para além da fachada do folclore e do exótico rola muito preconceito.
Grande abraço,
P.

ducamillo disse...

Alem de concordar com a matéria e dois comentários, gostaria de deixar aqui o meu parecer. Existe alguma religião que possamos ao menos chamar de séria? Alguma que não tenha seu ponto de partida gerado de uma mentira? Ou alguma que divida tudo que arrecada dos seus fiéis em benefício dos mesmos????
Mas tem uma coisa que me incomoda muito mais, estes que se dizem seguidores de Cristo esqueceram-se que o dito tal, nunca cobrou nada para operar seus milagres ou dar suas palestras, bem ao contrário destes que se julgam emissários dele.

Robertho Camillo.

Paulo Sales disse...

Sim, Robertho, também acho que as religiões, até onde eu saiba, estão assentadas em mentiras ou distorções. O princípio é o mesmo, mas acho que há diferentes escalas de interesses e de desonestidade. Posso encontrar, por exemplo, na igreja católica uma pessoa séria como Dom Evaristo Arns e alguns outros, gente séria, que dedicou a vida aos carentes. Nas seitas neopentecostais só há picaretas, gente mal intencionada mesmo, como Feliciano e Edir Macedo. Isso faz uma grande diferença, creio.
Obrigado pelo comentário e apareça sempre.
Um abraço.

ducamillo disse...

Paulo.
Tenho que render-me ao seu comentário e se me permite, gostaria de mencionar Chico Xavier que vez da sua existência um pronto socorro para almas sofredoras e se faz mais que necessário, já que estamos falando em exceções, mencionar Madre Tereza de Calcutá.
Agradeço pela oportunidade.
Robertho Camillo.

Paulo Sales disse...

Bem lembrado, Robertho. Cito ainda Irmã Dulce, cuja história e obra conheço bem e que quase 20 anos depois de sua morte continua ajudando pessoas carentes com as obras sociais que deixou de legado. Enfim, há pessoas que merecem o nosso crédito.